Não é novidade que o sistema judiciário brasileiro enfrenta uma crescente sobrecarga. Em dados levantados pelo Supremo Tribunal Federal, 2024 teve um aumento de 9,5% no número de novos processos, com uma demora média de quatro anos e três meses para serem solucionados.
Ao trazer os números para os conflitos societários, a demora média para a sua resolução pode chegar a quase uma década, visto que questões como divisão de lucros, gestão, propriedade intelectual e apuração de quotas prolongam ainda mais esses processos.
Enquanto as sociedades aguardam uma decisão judicial, a insegurança jurídica impacta negativamente seus negócios, pois a tomada de decisões estratégicas fica comprometida, a atração de novos clientes e investidores se torna mais difícil e oportunidades de mercado podem ser perdidas.
Paralelo à essa realidade, a maior parte dos conflitos societários poderia ser resolvida de forma mais rápida e econômica através de procedimentos extrajudiciais nas Juntas Comerciais, uma alternativa pouco explorada.
A solução extrajudicial: Juntas Comerciais
As Juntas Comerciais, além de serem responsáveis pelo registro e acompanhamento das empresas, oferecem um mecanismo ágil e eficiente para a resolução de diversos conflitos societários. Através de procedimentos administrativos, é possível solucionar disputas como: exclusão de sócios, alterações contratuais, dissolução da sociedade e outros.
Imagine uma situação em que a maioria dos sócios de uma empresa percebe que um deles está praticando atos que colocam em risco o negócio, como concorrência desleal ou violação ao contrato social. A primeira solução que vem à mente é recorrer ao Judiciário para que esse sócio seja retirado dos quadros sociais, esquecendo, muitas vezes, que a legislação oferece uma alternativa mais rápida e eficiente: a resolução administrativa perante a Junta Comercial
O artigo 1.085 do Código Civil prevê a possibilidade de exclusão de um sócio por justa causa mediante alteração contratual. Essa alteração pode ser registrada na Junta Comercial, que, após verificar o cumprimento dos requisitos formais (como realização de assembleia, convocação, presença do quórum e a própria alteração contratual), promoverá o arquivamento do contrato social com a exclusão do sócio.
Os Recursos e o Plenário da Junta Comercial
E se o sócio excluído não concordar com a decisão de exclusão registrada na Junta Comercial? Agora ele precisa recorrer ao Judiciário?
A resposta é não! A Lei de Registro Público (Lei n. 8.934/94) prevê um mecanismo interno para a revisão dos atos de arquivamento: o processo revisional. Esse processo ocorre dentro da própria Junta Comercial e oferece diversas etapas de recurso, como o Pedido de Reconsideração, Recurso ao Plenário e Recurso ao Departamento Nacional de Registro e Integração (DREI).
Em linhas simples: o sócio excluído pode iniciar o processo administrativo para tentar reverter a exclusão. Caso não seja atendido na primeira instância, pode recorrer ao Plenário da Junta Comercial, um órgão colegiado formado por especialistas que analisarão o caso de forma mais aprofundada.
Um detalhe importante é que a composição do Plenário garante que as decisões sejam analisadas por especialistas com consolidado conhecimento na área empresarial, o que contribui para uma análise mais aprofundada e justa. Além de que, uma vez recebido o Recurso, o Plenário da Junta Comercial tem o prazo máximo de 30 (trinta) dias para proferir a sua decisão.
Se ainda assim não concordar com a decisão, poderá recorrer ao DREI, órgão máximo do Sistema Nacional de Registro de Empresas Mercantis que possui competência para uniformizar a interpretação e a aplicação da legislação sobre registro de empresas.
E como fica o Judiciário? Quando o utilizar?
A análise da Junta Comercial se limita à verificação da formalidade dos atos. Ou seja, ela verifica se os procedimentos foram realizados corretamente, mas não se aprofunda no mérito da prática do ato, como, por exemplo, se o motivo que ensejou a exclusão é ou não uma “justa causa”.
Portanto, se o questionamento for de mérito (ex: analisar se o ato é ou não uma falta grave), o caminho mais adequado ainda é o Judiciário, uma vez que apenas o processo judicial poderá analisar o mérito da questão e determinar se a exclusão foi, de fato, justificada.
Conclusão
Ao compreender a atuação das Juntas Comerciais, percebe-se que elas vão além do registro e arquivamento dos atos societários. Com o fornecimento de um mecanismo interno de revisão de decisões, elas se tornam uma ferramenta valiosa para a resolução ágil e extrajudicial de conflitos societários, como a exclusão de sócios.